domingo, 25 de setembro de 2011

Ainda sobre a amizade...

"E um adolescente disse: "Fala-nos da Amizade."
 
E ele respondeu, dizendo:
"Vosso amigo, é a satisfação de vossas necessidades.
Ele é o campo que semeias com carinho e ceifais com agradecimento.
E vossa mesa e vossa lareira.
Pois ides a ele com vossa fome e o procurais em busca da paz.
Quando vosso amigo manifesta seu pensamento, não temeis o "não" de vossa própria opinião, nem prendeis o sim.
E quando ele se cala, vosso coração continua a ouvir o seu coração,
Porque na amizade, todos os desejos, ideais, esperanças, nascem e são partilhados sem palavras, numa alegria silenciosa.
Quando vos separeis de vosso amigo, não vos aflijais
Pois o que vós ameis nele pode tornar-se mais claro na sua ausência,
Como para o alpinista a montanha aparece mais clara, vista da planície.
E que não haja outra finalidade na amizade a não ser o amadurecimento do espírito,
pois o amor que procura outra coisa a não ser a revelação de seu próprio mistério não é o amor, mas uma rede armada, e somente o inaproveitável é nela apanhado.
E que o melhor de vós próprio seja para o vosso amigo.
Se ele deve conhecer o fluxo de vossa maré, que conheça também o seu refluxo
pois que achais seja vosso amigo
para que o procureis somente a fim de matar o tempo?
Procurai-o sempre com horas para viver.
Pois o papel do amigo é o de encher vossa necessidade, e não vosso vazio.
E na doçura da amizade,
que haja risos e o partilhar dos prazeres.
Pois no orvalho de pequenas coisas,
o coração encontra sua manhã e se sente refrescado."
(Khalil Gibran)

Sobre a amizade...

Michel de Montaigne diz sobre sua amizade com Etienne de La Boétie:


“Se compararmos a afeição com as mulheres à nossa amizade, não poderemos, embora nasça de nossa escolha, colocá-la no mesmo rol: seu ardor, confesso-o, é mais ativo, mais abrasador, mais áspero; mas vem de uma chama temerária e volúvel, ondulante e vária; é um ardor de febre, sujeito a acessos e a quedas, e, e que nos prende apenas por um lado.Na amizade, o calor é generalizado, temperado, aliás, e igual; um calor constante tranqüilo, feito de doçura e polidez, que nada tem de áspero nem de pungente.

Mais ainda: o amor não passa de um desejo impetuoso por algo que nos foge....Em verdade aquilo que nós damos comumente o nome de amizade não passa de conhecimento ou de familiaridade, estabelecido ao acaso ou por interesse, e através do qual nossas almas se comunicam.

Na amizade a que me refiro, mesclam-se as almas, e se confundem em tão completa união, que se apaga e não mais se descobre a costura que as prende. Se insistirem em perguntar-me por que eu o queria, sinto que não o poderia exprimir, senão respondendo:”Porque ele era ele e eu era eu”(...)

...Nós nos procurávamos antes mesmo de nos termos visto, através de referencias ouvidas um do outro e que tinham sobre nossa afeição maior força do que as relações; creio que por disposição especial do Céu.

Abraçávamo-nos pelos nossos nomes e, no nosso primeiro encontro, que ocorreu por acaso durante uma grande festa na cidade, achamo-nos tão próximos, tão íntimos, tão ligados um ao outro, que nada nos pareceu, desse então, mais unido do que nós...

Desde o dia em que o perdi arrasto-me desalentado; e os próprios prazeres que se me oferecem, em vez de consolar-me, aumentam a amargura de sua perda.

Tudo dividíamos pela metade e hoje tenho a impressão de que lhe roubo a sua parte.

Já me achava tão acostumado e afeito a ser o segundo em tudo, que me parece ser agora apenas uma metade..."


Montaigne teve uma amizade especial também por Maria de Gournay, a quem chamava "filha por afinidade", ele dizia:

"por certo querida muito mais que paternalmente, e conservada no meu retiro e na minha solidão, como uma das melhores partes de meu próprio ser."